ZOOROMANTA
ArtBlog
segunda-feira, 21 de maio de 2012
Hiroshima meu Amor
Cruz
O maior das obras apresentadas na Fundació Tapiés representam o que é mais popular na obra do artista catalão, telas grandes com fundo branco manchadas por traços marcadamente negros, que multiplicam a gestulalidade inserida pelo artista. (Se) são abstractas, neo-abstractas, simbolistas, neo-simbolistas, se são trabalhos que procuram instalar na consciência uma nova ordem ao signo (mas Tapiés fa-lo de sempre de forma composita), tudo é possivel, isto, se for mantida a condição verbal.
Uma das obras é uma cadeira de madeira que tem sobre si um incontável numero de panos velhos, fortemente influenciado por Robert Rauschenberg, aliás este artista americano devera ter sido a porta para Tapiés abandonar os trabalhos de tinta de tinta china do início da sua carreira, que são meramente geométricos, aparentemente tenta agilizar o discurso e estiliza-los, mas é em vão. E os trabalhos a óleo sobre tela, de formato pequeno/médio, ainda estão carregados de formnalismos simbólicos tão cliché quanto kitsh.
Há ainda diversas esculturas em barro, uma é um sapato gigante, as outras são peças de médio porte, filiadas a um grotesco introvertido.
No andar superior, onde há um terraço, há um pé que calça uma meia brança com uma cruz preta que poderá representar o sacrifício do peregrino, tem seis metros de altura e é um protótipo que iria ser colocado num lugar público de Espanha, mas que foi rejeitado pelo respectivo ajuntamento.
Fundação Tápies- Barcelona
Persona
Na Fundació Miró o que prevalece do enorme acervo é a repetição de uma dinâmica discursiva: os fundos têm um ritmo especifico, estático, e é partir desta base que constroi as suas obras, seja de forma minimal, uma mancha que segue o circular do pincel às quais denomina de “personagens”, ou, de forma explosiva, onde as cores se sobrepõe até formarem formas abstracto-concretas. Esta ambiguidade é uma constante no acervo da Fundação, saber o que remete para o caos ou para harmonia, para o conciente ou inconsciente, para beleza ou para fealdade, a duvida é de tal forma corrosiva que se torna profundamente sedutora. A certreza que gradualmente se instala é a de que deveria conhecer a obra de Freud, já a que forma como procura introduzir o espectador nas suas obras é questiona-lo sobre o seu papel na sociedade, e ao faze-lo revela-lhes a angustia que provoca a existência, particularmente quando esta ganhou uma dimensão de vazio em 1945 ao explodir em Hiroshima a primeira boma atómica. Há uma obra em particular, que é papel armado num gradeamento, o artista incendiou-a e deixou arder, o que revela é uma cruz, a mesma que Tapiés transportou ao longo da sua vida.
Fundação Miró- Barcelona
100 anos
“100 anos de Arte” é o slogan do Museu Nacional d'Art de Catalunya, inserido numa estrutura neo-classica construida em 1929, para exposição de arte de Espanha. São 100 anos que podem ser vistos em aproximadamente três horas, Tiziano, Él Gréco, o retábulo, a escultura, baixos relevos, fotografia. Agrupadas por géneros estécticos como: Romanico, Gótico, Renascimento e Barroco este ultimo núcleo era pertença da colecção Tyssen-Bornemisza. Por géneros: numismática, desenhos, fotografia. O acervo do museu é de uma qualidade abissal, quer no valor das peças, na sua manutenção, na iluminação, na conjugação de cada núcleo histórico, e nos respétivos textos explicativos que acompanham as obras. Adequado, a visitas de estudo por parte de jovens de História de Arte.
Museu Nacional da Catalunha- Barcelona
Meninas
O Museu Picasso apresenta vários nucléos, os primeiros passos deste artista, isto é, quando ainda tinha 12 anos, nesta fase o que impera é o naturalismo e o retrato, realizados de forma minuciosa, aproximamdo-se da perfeição.
O núcleo onde se encontram os trabalhos que realizou para jornais, maioritariamente caricaturas, cromos. Estas obras resultam do abandonado a casa dos pais, estes estavam contra o facto de Picasso ter abandonado o curso de direito e ter seguido a vida artística. Nada a declarar, estão assinados por Picasso, podiam ser de outro autor qualquer? Podiam! Picasso quando persegue os formalismos de uma determinada estética, transforma-se em algo entediante, pois não emerge o génio que rompe as fronteiras da tela.
Há uma outra fase em que Picasso retrata as figuras de Paris, aproximando-se do pós-impressionismo de Toulouse-Lautrec, talvez seja um pouco mais exuberante na forma e nas cores, mas os temas entre os dois artistas são semelhantes: prostitutas, alcoólicos, marginais, donos de bares e restaurantes.
A fase azul é onde se começa assumir um Picasso ousado, que se liberta de influencias externas e cria um conceito que passa por apresentar uma figura seja um rosto ou uma paisagem e posteriormente colocar-lhe um azul fusco. Algo que as impregna de uma poesia transgressora, como se filtro fosse o condutor do estado emocional dos seus objectos de trabalho.
O núcleo que tem um valor incomensurável são as versões realizadas a partir das “Meninas” do Goya. Por se tratarem de decomposições a partir de diferentes planos sobre a obra prima de Goya, por a decomposição ter sido realizada a partir do cubismo, o que nos obriga a ve-las de uma forma constante e de diferentes angulos. A relação entre estes trabalhos e o original é o tema e as perspectivas cruzadas, que impedem o cérebro de estabelecer níveis de correspondencia e o olhar perde-se na procura de algo em que se possa apoiar. O resultado é desconcertante, como se um cientista se houvesse decidido a dividir uma particula na procura de um elemento que lhe desse a descrição de um organismo.
A transmutação estética de Picasso, muitas das vezes passando para estéticas opostas à que anteriormente explorou, revelam um artista que tinha total domínio sobre a matéria que ao altera-la, compondo-a, destruido-a, transformando-a em algo que jamais havia sido visto por outrém, até ao segundo em que assina o quadro.
Museu Picasso- Barcelona
Photo(s)
As fotografias são de tamanho pequeno, todas elas têm o mesmo formato: rectangulares. O tema é o trafico de droga, em especial o mais violento e vil, que vitima milhares de pessoas por ano no México. Há cabeças tatuadas, mulheres que se prostituem aos capos, homens a snifar coca, mulheres com metralhadoras junto a carros de alta cilindrada, homens baleados... Quando chegado a esta fotografia questiono-me da veracidade da exposição, versa o quê afinal? A realidade pura e dura dos carteis da droga? Ou será que estou a ver uma encenação? Há dois níveis narrativos: a ficção, em que se vêem as câmaras de filmar, que estão a rodar uma pélicula; e a realidade em que segue a policia faz rusgas, entra em instalações muradas, ou mulheres colocam farinha sobre manchas de sangue que se encontravam no alcatrão. É esta ambiguidade que torna exposição interessante, a questão da ficção versus realidade e a eterna questão: qual das duas vertentes é a que imita a ficção ou a realidade. De realçar as cores quentes da “Narcocultura”, a convidar um olhar pausado mas simultaneamente a dar a “temperatura” ambiente onde ocorrem os crimes.
“Narcocultura”, Shaul Schwarz, integrada na colectiva “Más Fotoperiodismo: Visa pour l`image—Perpigang”, de 1 de Março a 28 de Maio, Centro Cultural de Arte Contemporânea de Barcelona.
“Los caminos de La Revolucion” revelam imagens da revolução da Primavera arábe, mais precisamente na Siria. Como qualquer revolução há inumeros paradoxos que a caracterizam: há sangue, fogo, mortos, pessoas a gritar e a rir, cadávares, bandeiras a arder. A narrativa apresentada por Yuri Kozyrev, é o de uma nação que se encontra à deriva por rejeitar a ditadura que os governou durante décadas e que os escravizou dando as mãos à religião muculmana. O registo fotográfico, procura a partir da relevância que da à parte, representar a vontade de um povo, fugindo pontualmente à reportagem de guerra, pois apresenta diversas figuras numa gestualidade simbólica, como se— mesmo quando estão a matar—estivessem a rezar por um fim feliz que foi-lhes prometido pela liberdade que se encontra à distancia de um clike na internet.
“Los Caminos de La Revolucion”, Yuri Kozyrev, integrada na colectiva “Más Fotoperiodismo: Visa pour l`image—Perpigang”,
de 1 de Março a 28 de Maio, Centro Cultural de Arte Contemporânea de Barcelona.
Duplos
Na CaixaForum encontra-se uma dupla separada por cem anos de existêcia Goya e Delacroix, mas unidos através do romantismo. O primeiro apresenta diversos retratos, na sua maioria delineados a partir da lógica do claro escuro. Assim, como Delacroix, este que tinha como referência máxima Goya, tem trabalhos de corpo inteiro, levando o conceito ao extremo. Ambos apresentam cenas bíblicas, aliás este livro foi fonte para a imaginação de muitos artistas plásticos que encontravam na sua leitura um mundo esotérico que posteriormente exploravam. As obras mais interessantes de Delacroix exibe tigres a atacarem cavalos, o que importa é o movimento que se estabelece, e a lógica peso versus velocidade que o tigre imprime sobre o cavalo. Uma das obras mais arrepiantes de Goya, apresenta diversos náufragos que conseguiram subir para um barco de dimensões reduzidas que constava no Galeão para quando fosse necessário visitar uma ilha. Um dos sobreviventes faz a contabilidade de quantos se encontram a bordo e realiza o levantamento de quem é o próximo a ser morto para alimentar a tripulação. Mas há um ponto na obra de Goya que não encontra eco na obra Delacroix, que são as gravuras que tiveram origem nos pesadelos do artista. Apresentam um ser antropomórfico que corresponde a um burro, que ao usar a gestualidade de um humano está representa-lo, e assim realiza diversa criticas à sociedade: a pedófilia praticada pelo clero, a abundância e a ignorância da nobreza, o poder da realeza e a sua iletracia. As pequenas gravuras são grandiosas porque estabelecem uma nova forma de comunicar com o espectador: este reve-se no burro mas simultaneamente rejeita-o, e se nos atermos que são datadas do século XVIII, revelam uma sociedade que se movimentava unica e exclusivamente pelo interesse, esquecendo ou ignorando outros valores que deveriam ser cultivados pelo homem.
“Luzes e Sombras”, Goya, CaixaForum Centre Social e Cultura, de 16 de Março a 24 de Junho.
Delacroix, CaixaForum Centre Social e Cultura , de 15 de Fevereiro a 20 de Maio.
Teatro
Josep Roca I Bros foi o responsável pela transformação de um antigo teatro, na cidade de Figueras, em Teatro-Museu Dalí. Visto do lado de fora vêem-se torres e uma ogiva de vidro, as paredes da primeira são vermelhas com pães a pontuar as paredes, no cimo há ovos gigantes. Na entrada, mas ainda no exterior, há um gradeamento em ferro circular que protege as esculturas e em que consta a seguinte inscrição: “El pensment català rebrota sempre I sobreviu als seus il-lusos enterradors”. No interior da cerca, há raizes que trepam por um busto em pedra ao qual se sobrepõe uma cabeça em bronze. Atrás destes, há um corpo de pedra de dimensões maiores que o(s) busto(s), que tem no peito um baixo relevo, a partir daqui delineia-se uma figura tutelar de manto branco e com a mão direita a tocar na sua cabeça oval, como um pensador embrenhado em alucinogénios, ou, nos estivesse a alertar para o facto que uma vez entrados no mausoléo de Dalí, jamais voltaremos a ser os mesmos? Uma e outra são respostas que devolvo a quem tiver coragem de ver este Teatro onde a persona tutelar é um homem que agrega em si um universo onde imperam violações à consciência humana.
No interior há escultura, instalação, salas tematicas como é o caso da Mae West, desenho, jogos de espelhos, cama, gravuras, aguadas, colagens, baixo-relevo, cartazes de touradas, fotografias do Rei de Espanha, jóias, o túmulo de Dalí, o carro de Dalí, a sua musa e esposa Galá é uma segunda alma a passear pelos corredores do Teatro. Tudo em Dalí é magnânimo e extravagante, as figuras que ocupam os nichos do interior ou os grotescos, que pretendem comunicar com o visitante através de um silêncio arrepiante. Mas o que mais surpreende na obra de Dalí é a sua técnica, que pode ser avaliada nos desenhos, que é de tal forma supra-humana que é impossivel especificar os dias ou as horas que dedicou a cada obra para atingir a perfeição. O génio é aquele que é capaz de desafiar, primeiramente os que se encontram no pedestal da genialidade, ao derruba-lo, só lhe resta desafiar o seu próprio génio. E é nesta perspectiva que se deve ver Dalí, um homem no seu labirinto, que obra após obra vai aumentando o enigma e a partir do qual não pretende salvar-se ou sacrificar-se para se levantar de seguida. Há uma obesessão que versa construir uma perspectiva e na pincelada seguinte uma contra perspectiva, mecanismo que explora recorrentemente para deformar a visão do espectador e este sentir-se na terra do nunca. Muitas vezes esta solução redunda num espaço vazio e desta forma Dalí entra no inconsciente dos espectadores de forma consciente, segregando as imagens que bem entende. Se ainda não referi que a estética dominante é o surrealismo, apesar de no teatro constarem obras de outras fases do artista catalão, é porque me pareceu despropositado. A obra de Dalí corresponde a um universo de tal forma vasto e diverso e em que os actores convocados para esta dramaturgia têm que incorporar as linhas gerais do sacrifício, e assim corresponder às exigências do encenador Salvador Dalí.
Teatro-Museu Dalí- Figueras
segunda-feira, 30 de janeiro de 2012
A Valsa dos Detectives
Carlos Carreiro é o artista plástico mais famoso de Portugal e simutâneamente é o mais esquecido. E porque a fama? Em 1989 assina a capa da “Valsa dos Detectives” (1989) da banda portuense GNR e desta forma entra pela porta adentro de milhares de pessoas e ocupa o seu imaginário. E porque o esquecimento? Carlos Carreiro é o maior crítico do tempo social e cultural que actualmente ussufruímos.
A exposição “Carlos Carreiro na Colecção de Carlos Carreiro” é um excelente resumo de mais de quarenta anos dedicados à pintura. Onde são perceptiveis diversos vértices, as obras dividem-se em dois niveis: tematico e narrativo sendo que estes conceitos se podem cruzar numa unica obra.
Na imagem narrativa mesmo que esta seja direccionada invarialmente para o absurdo, e não para o banal non sense, as obras ganham uma dimensão extraordinária. Como sucede com “Diálogo” (1981) em que impera o teatro do absurdo, e onde o espaço fruido é o vazio, algo que irá sofrer drásticas alterações ao longo da sua carreira. A forma que explora é o da pop extravagante, supremo kitsh, longe dos trabalhos gráficos de Warhol ou do estilismo B.D de Lichestein. Carreiro suplanta um e outro através de uma ironia atroz, de uma sabedoria que não se deixa seduzir pelo facilitismo, que apenas se revé no complexo se este for “lido” através da simplicidade.
Uma obra de claro pendor tematico é “Lagoa das Furnas” (1970), o contorno de uma estrutura arquitectonica, na parte inferior da tela, é posterior “janela” com vista para a lagoa das furnas, terra que viu nascer o artista em 1946. “A piscina da família Éclair (2ª versão)”, o centro do quadro é ocupado por uma piscina circular de interior, sobre o colchão flutuante um éclair relaxa, nas bordas da piscina outros dois éclairs molham-se sem se diluirem na água fetida a cloro, e um pouco afastados da piscina dois éclaires namoram. Poderá dizer-se que “novos ricos são má sorte ”? E o que move esta familia de éclairs? Toda esta encenação surreal revê-se no: “Compra aqui, compra aqui” . As suposições sobre uma obra que poderia ser um poster sobre a irracionalidade da existência pois espelha um bolo que substitui as pessoas, mas a família éclair será uma mera abstracção? “´… Depois dvd ddt pbx; Ketcup k7 kitchenette duplex; twist again colourful wonderful; Chegou o t2/t4 c/ garagem pró turbo sound disco; Sound discussão? Video-club joy stick midi high-tech squash & sauna; Compact d (compre aqui)…´”
“A importância do Leite” (1973) encontram-se as duas vertentes, anteriormente discriminadas: a narrativa e a temática. Uma sala de uma familia burguesa do século passado, acolhe uma vaca e a seu lado um homem aplica as mãos nas tetas e retira-lhes leite enquanto fala com três senhoras, uma das quais segura um objecto fálico, todas demonstram curiosidade pela actividade do leiteiro. Porém, uma outra mulher encontra-se sentada numa ponta do sofá, nos seus joelhos tem um livro, e observa as mulheres que questionam o leiteiro sobre a sua actividade. Ela encontra-se ladeada por um candeeiro sobre uma mesa de jogo, por cima do qual encontra-se um quadro com um pássaro vermelho, e sobre a sua cabeça está um relógio de pé. Há uma janela com vista para uma paisagem subaquatica, um outro elemento perturbador é aquele que surge a partir dos traseiros das curiosas, um espaço asséptico onde ratos da india recebem electro-choques.
O mundo animal cruza-se constantemente na obra de Carlos Carreiro como sucede em “Ausência” (1974) ou em “Senhor respeitavel profundamente preocupado com problemas de exploção Demografica”(1976), ambos têm o objectivo supremo de obrigar o espectador a rever-se no reino animal, e a partir deste reencontrar ou redescobrir o seu lugar na terra, a comunicação é realizada através da ironia que é levada ao extremo, denominado de sarcasmo.
As narrativas paralelas em “Quando a cor entrou na Família”(1982), do lado esquerdo da tela encontra-se uma familia sentada a uma mesa, a decoração é obra de um amante do Kitsch, mas obra é a preto e branco assumindo-se o negativo do lado direito do trabalho. Neste a familia triste ganha uma dimensão de jogo, através da cor surgem diversas dinamicas: uma mulher com um chicote impõe o ritmo a um homem de quatro. Sobre a cabeça da dominadora, um trans-humano que representa um cavalo, está sobre um baloiço. Um homem suspenso por cordas e com asas nas costas tem uma mulher a segurá-lo pelas costas, ela pretende segui-lo, aprisiona-lo. Um homem de costas para o espectador, com uma capa e botas de Robin Hood, olha através de uma janela rectangular para uma paisagem verdejante, de onde é apenas visivel, quatro pernas nuas, a cometerem um óbvio coito. Um homem, com roupas de corte de Luís XV tenta entrar ou sair por um quadro colocado na parede. Na boca de cena, uma mulher nua chora a morte do seu amado que é carne e osso em simultâneo, o seu rosto pertence a uma esfinge desenhada por uma criança.
O espaço encontra-se totalmente ocupado, numa vertente pós-rococó em “Paisagem muito Habitada” (1985), em que impera o excesso de informação, algo que o cérebro não tem habilidade natural para fruir rapidamente. A obra impõe-se através da sua natureza perversa, alicerçada numa clara vertente absurda, e que se reporta para uma dinamica construtivista e desconstrutivista.
As obras mais intrigantes são: “Cenário para uma Alegoria” (1988), “Paisagem com efeitos Especiais” (1993), “Interior Octopus” (1990). Remetem para um interior, mas não das visceras, antes o de um universo onirico de tão poético, que poderá reportar-se às “Vinte Mil Léguas Submarinas” de Júlio Verne. É de assinalar a mestria com que também compõe o espaço vazio, mas com origem numa flutuação indescritivel de tão bela.
“Valsa dos Detectives”, a poética é assim: “Tem medo do escuro tal criança sem futuro; É falso velhaco cobarde armado em duro; Vai pelo mundo guiado pela mão; Até depois de morto dá uma volta no caixão; Treme e vacila nem na cama está seguro; Teme que alguém o chame geme sofre de medo puro; Evita o olhar dos mortais que o rodeiam; esconde-se em mentiras que mesquinham serpenteiam; É só paranoia mania da perseguição; Desconfia de todos resulta da sua traição” . Rui Reininho faz o retrato do português emigrante, do português residente num bairro rico ou pobre ou remediado ou retornado ou sem abrigo, pouco importa, o certo é que é portugues. Na obra de Carlos Carreiro impõem-se três figuras, um casal que dança por entre uma paisagem luxuriante conspurcada por elementos vegetalistas e arquitctónicos. No lado oposto, uma mulher segura na mão esquerda uma ampulheta, que mede o tempo, os três personagens representados a azul revela-os como almas libertadas da asfixia terrena. Carlos Carreiro e Rui Reininho têm em comum o terem previsto uma sociedade de consumo selvagem, que criou valores a partir do dinheiro e de todos os critério a este associado. A mutação provocada pela cirurgia plástica, que impõe protéses nas mulheres para ficarem próximas das modelos que ocupam as passereles ou as revistas. O parecer passa a moeda de troca, o ser perde-se gradualmente no fim do século passado e ganha liberdade total no início do século XXI, “falha humana, falha humana do criador” ?
A obra de Carlos Carreiro é fruto de um espírito irrequieto que nunca abandonou a infância, que teve que se adaptar à natureza que o obrigou a crescer. Quando inicia uma obra, a liberdade transforma-se em travessuaras e são tantas que Carlos Carreiro abandona-se inconscientemente nas mãos do seu heterónimo, que jamais teve medo do futuro e disso é exemplo cada uma das suas obras incluidas em “Carlos Carreiro na Colecção de Carlos Carreiro”.
“Carlos Carreiro na Colecção de Carlos Carreiro- 1967/2010", de 26 de Novembro de 2011 a 29 de Janeiro 2012, Galeria Municipal de Matosinhos. 26 de Janeiro @ Matosinhos.
1ª Citação: REININHO, Rui, Líricas Come on & Anas (1982-2006),Palavra, Lisboa, 2006, p.46
2ª Citação: REININHO, Rui, Líricas Come on & Anas (1982-2006), Palavra, Lisboa, 2006, p.25.
3ª Citação: REININHO, Rui, Líricas Come on & Anas (1982-2006), Palavra, Lisboa, 2006, p.25.
4ª Citação: REININHO, Rui, Líricas Come on & Anas (1982-2006), Palavra, Lisboa, 2006, p.39.
5ª Citação: REINHINO, Rui, in Valsa dos Detectives, Falha Humana, Emi-Valentim de Carvalho, Lisboa, 1989.
A exposição “Carlos Carreiro na Colecção de Carlos Carreiro” é um excelente resumo de mais de quarenta anos dedicados à pintura. Onde são perceptiveis diversos vértices, as obras dividem-se em dois niveis: tematico e narrativo sendo que estes conceitos se podem cruzar numa unica obra.
Na imagem narrativa mesmo que esta seja direccionada invarialmente para o absurdo, e não para o banal non sense, as obras ganham uma dimensão extraordinária. Como sucede com “Diálogo” (1981) em que impera o teatro do absurdo, e onde o espaço fruido é o vazio, algo que irá sofrer drásticas alterações ao longo da sua carreira. A forma que explora é o da pop extravagante, supremo kitsh, longe dos trabalhos gráficos de Warhol ou do estilismo B.D de Lichestein. Carreiro suplanta um e outro através de uma ironia atroz, de uma sabedoria que não se deixa seduzir pelo facilitismo, que apenas se revé no complexo se este for “lido” através da simplicidade.
Uma obra de claro pendor tematico é “Lagoa das Furnas” (1970), o contorno de uma estrutura arquitectonica, na parte inferior da tela, é posterior “janela” com vista para a lagoa das furnas, terra que viu nascer o artista em 1946. “A piscina da família Éclair (2ª versão)”, o centro do quadro é ocupado por uma piscina circular de interior, sobre o colchão flutuante um éclair relaxa, nas bordas da piscina outros dois éclairs molham-se sem se diluirem na água fetida a cloro, e um pouco afastados da piscina dois éclaires namoram. Poderá dizer-se que “novos ricos são má sorte ”? E o que move esta familia de éclairs? Toda esta encenação surreal revê-se no: “Compra aqui, compra aqui” . As suposições sobre uma obra que poderia ser um poster sobre a irracionalidade da existência pois espelha um bolo que substitui as pessoas, mas a família éclair será uma mera abstracção? “´… Depois dvd ddt pbx; Ketcup k7 kitchenette duplex; twist again colourful wonderful; Chegou o t2/t4 c/ garagem pró turbo sound disco; Sound discussão? Video-club joy stick midi high-tech squash & sauna; Compact d (compre aqui)…´”
“A importância do Leite” (1973) encontram-se as duas vertentes, anteriormente discriminadas: a narrativa e a temática. Uma sala de uma familia burguesa do século passado, acolhe uma vaca e a seu lado um homem aplica as mãos nas tetas e retira-lhes leite enquanto fala com três senhoras, uma das quais segura um objecto fálico, todas demonstram curiosidade pela actividade do leiteiro. Porém, uma outra mulher encontra-se sentada numa ponta do sofá, nos seus joelhos tem um livro, e observa as mulheres que questionam o leiteiro sobre a sua actividade. Ela encontra-se ladeada por um candeeiro sobre uma mesa de jogo, por cima do qual encontra-se um quadro com um pássaro vermelho, e sobre a sua cabeça está um relógio de pé. Há uma janela com vista para uma paisagem subaquatica, um outro elemento perturbador é aquele que surge a partir dos traseiros das curiosas, um espaço asséptico onde ratos da india recebem electro-choques.
O mundo animal cruza-se constantemente na obra de Carlos Carreiro como sucede em “Ausência” (1974) ou em “Senhor respeitavel profundamente preocupado com problemas de exploção Demografica”(1976), ambos têm o objectivo supremo de obrigar o espectador a rever-se no reino animal, e a partir deste reencontrar ou redescobrir o seu lugar na terra, a comunicação é realizada através da ironia que é levada ao extremo, denominado de sarcasmo.
As narrativas paralelas em “Quando a cor entrou na Família”(1982), do lado esquerdo da tela encontra-se uma familia sentada a uma mesa, a decoração é obra de um amante do Kitsch, mas obra é a preto e branco assumindo-se o negativo do lado direito do trabalho. Neste a familia triste ganha uma dimensão de jogo, através da cor surgem diversas dinamicas: uma mulher com um chicote impõe o ritmo a um homem de quatro. Sobre a cabeça da dominadora, um trans-humano que representa um cavalo, está sobre um baloiço. Um homem suspenso por cordas e com asas nas costas tem uma mulher a segurá-lo pelas costas, ela pretende segui-lo, aprisiona-lo. Um homem de costas para o espectador, com uma capa e botas de Robin Hood, olha através de uma janela rectangular para uma paisagem verdejante, de onde é apenas visivel, quatro pernas nuas, a cometerem um óbvio coito. Um homem, com roupas de corte de Luís XV tenta entrar ou sair por um quadro colocado na parede. Na boca de cena, uma mulher nua chora a morte do seu amado que é carne e osso em simultâneo, o seu rosto pertence a uma esfinge desenhada por uma criança.
O espaço encontra-se totalmente ocupado, numa vertente pós-rococó em “Paisagem muito Habitada” (1985), em que impera o excesso de informação, algo que o cérebro não tem habilidade natural para fruir rapidamente. A obra impõe-se através da sua natureza perversa, alicerçada numa clara vertente absurda, e que se reporta para uma dinamica construtivista e desconstrutivista.
As obras mais intrigantes são: “Cenário para uma Alegoria” (1988), “Paisagem com efeitos Especiais” (1993), “Interior Octopus” (1990). Remetem para um interior, mas não das visceras, antes o de um universo onirico de tão poético, que poderá reportar-se às “Vinte Mil Léguas Submarinas” de Júlio Verne. É de assinalar a mestria com que também compõe o espaço vazio, mas com origem numa flutuação indescritivel de tão bela.
“Valsa dos Detectives”, a poética é assim: “Tem medo do escuro tal criança sem futuro; É falso velhaco cobarde armado em duro; Vai pelo mundo guiado pela mão; Até depois de morto dá uma volta no caixão; Treme e vacila nem na cama está seguro; Teme que alguém o chame geme sofre de medo puro; Evita o olhar dos mortais que o rodeiam; esconde-se em mentiras que mesquinham serpenteiam; É só paranoia mania da perseguição; Desconfia de todos resulta da sua traição” . Rui Reininho faz o retrato do português emigrante, do português residente num bairro rico ou pobre ou remediado ou retornado ou sem abrigo, pouco importa, o certo é que é portugues. Na obra de Carlos Carreiro impõem-se três figuras, um casal que dança por entre uma paisagem luxuriante conspurcada por elementos vegetalistas e arquitctónicos. No lado oposto, uma mulher segura na mão esquerda uma ampulheta, que mede o tempo, os três personagens representados a azul revela-os como almas libertadas da asfixia terrena. Carlos Carreiro e Rui Reininho têm em comum o terem previsto uma sociedade de consumo selvagem, que criou valores a partir do dinheiro e de todos os critério a este associado. A mutação provocada pela cirurgia plástica, que impõe protéses nas mulheres para ficarem próximas das modelos que ocupam as passereles ou as revistas. O parecer passa a moeda de troca, o ser perde-se gradualmente no fim do século passado e ganha liberdade total no início do século XXI, “falha humana, falha humana do criador” ?
A obra de Carlos Carreiro é fruto de um espírito irrequieto que nunca abandonou a infância, que teve que se adaptar à natureza que o obrigou a crescer. Quando inicia uma obra, a liberdade transforma-se em travessuaras e são tantas que Carlos Carreiro abandona-se inconscientemente nas mãos do seu heterónimo, que jamais teve medo do futuro e disso é exemplo cada uma das suas obras incluidas em “Carlos Carreiro na Colecção de Carlos Carreiro”.
“Carlos Carreiro na Colecção de Carlos Carreiro- 1967/2010", de 26 de Novembro de 2011 a 29 de Janeiro 2012, Galeria Municipal de Matosinhos. 26 de Janeiro @ Matosinhos.
1ª Citação: REININHO, Rui, Líricas Come on & Anas (1982-2006),Palavra, Lisboa, 2006, p.46
2ª Citação: REININHO, Rui, Líricas Come on & Anas (1982-2006), Palavra, Lisboa, 2006, p.25.
3ª Citação: REININHO, Rui, Líricas Come on & Anas (1982-2006), Palavra, Lisboa, 2006, p.25.
4ª Citação: REININHO, Rui, Líricas Come on & Anas (1982-2006), Palavra, Lisboa, 2006, p.39.
5ª Citação: REINHINO, Rui, in Valsa dos Detectives, Falha Humana, Emi-Valentim de Carvalho, Lisboa, 1989.
segunda-feira, 13 de setembro de 2010
Peter Pan
“A Casa das Histórias”, mudou de inquilino no dia nove de Setembro, este Museu é ocupado pelo falecido marido de Paula Rego, Victor Willing. Este representava um suporte fundamental na obra e vida de Paula Rego, ele era o encenador da obra da artista plástica portuguesa. Paula Rego emancipou-se na série “Dog and Girl”, que ainda foi executada enquanto Vic já se encontrava na recta final imposta pela esclerose múltipla. “Uma Retrospectiva”, é uma possibilidade para entrar em contacto com o universo de Victor Willing, que tem como denominador comum a escrita pop, cores alegres por vezes berrantes, com fundos falsos, de onde sobressaem rostos, ou, estruturas arquitectónicas que se assumem como utopias. Estas são as mais enigmáticas, pois derivam de um paradoxo construtivo que redunda num desfecho absurdo. Esta ironia ancora numa perspectiva futurista, que um dia se irá concretizar, o homem rompeu gradualmente com as utopias impostas e criadas por si. Vic apenas dá corpo a possibilidades, a ante-projectos, com resultados por vezes desconcertantes, onde o erro é deliberado, numa tentativa de auto-destruição do seu génio, alicerçando-o numa “bad painting”. O primeiro espaço do Museu é ocupado por retratos pop, de figuras que citam autores famosos, a segunda tem os mecanismos, a terceira exibe os estudos que deram origem a estes e na quarta sala estão os trabalhos mais próximos de um seu amigo: David Hockney. O que une estes agrupamentos é o estudo do tempo, a inexistência do homem, mas este deixou o seu rasto, seja o baloiço a balouçar, ou, o aeroplano abandonado numa savana que um corvo cruza o céu à procura de cadáveres. Há inúmeros pontos de convergência com o trabalho de Paula Rego, em especial os cenários, e onde não há personagens poderiam estar muitas das criadas e recriadas pela sua viúva, que demonstra uma comunicação eterna para com o amor que a uniu à pintura e lhe proporcionou uma união para além da arte.
Uma retrospectiva, Victor Willing, 09 de Setembro
Uma retrospectiva, Victor Willing, 09 de Setembro
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